O TCU (Tribunal de Contas da União) fez uma série de exigências ao governo federal para que revise as negociações que envolvem renovação de concessões de ferrovias do país. No entendimento da corte, os processos estão marcados por falhas que podem não garantir a melhoria do setor, tampouco a retomada de trechos abandonados.
Em sua decisão, o TCU determina que, em até 90 dias, o Ministério dos Transportes, a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) e a estatal Infra S.A. deverão elaborar um plano de ação individualizado para cada ferrovia com concessão em fase de encerramento.
Os planos devem conter descrição das etapas necessárias para a transição contratual; definição de prazos para cada etapa, indicação dos responsáveis pelas medidas a serem adotadas; estratégias para garantir a continuidade da prestação do serviço público; e ações para preservação do patrimônio ferroviário.
O governo terá de elaborar um documento para cada uma das cinco concessões com negociações em andamento: Ferrovia Centro-Atlântica (FCA), Rumo Malha Sul (RMS), Rumo Malha Oeste (RMO), Ferrovia Transnordestina Logística (FTL) e Ferrovia Tereza Cristina (FTC).
A determinação foi antecipada pela coluna Painel S.A.
“Tais contratos têm a duração de 30 anos e, a poucos meses do encerramento, inexiste decisão quanto aos rumos de cada concessão, assim como estão ausentes processos administrativos, atas das reuniões, definição formal de competências e atribuições entre o Ministério dos Transportes (MT), Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e Infra S.A”, afirmou, em seu voto, o ministro relator Jorge Oliveira.
O membro da corte afirmou, ainda, que deve ser analisada a possibilidade de alguns contratos serem extintos. “Como primeira alternativa, o MT buscaria prorrogar os cinco contratos de concessão com empresas com histórico reiterado de inadimplência contratual e abandono de trechos ferroviários. Alguns dos referidos contratos são objeto de avaliações que podem acarretar a declaração de caducidade”, declarou.
Na avaliação do TCU, diversas concessionárias descumpriram obrigações contratuais, desativaram trechos sem manutenção e não prestaram serviços adequados. O governo tem priorizado prorrogações antecipadas, mas sem considerar o histórico de descumprimentos, segundo a corte.
Ao todo, 49% da malha das concessões da FCA, RMS, RMO e FTL foi abandonada. Dos 19.544 km dessas ferrovias, 9.521 km são considerados não operacionais. Trechos foram desativados sem manutenção, levando à remoção de trilhos e deterioração da infraestrutura.
A corte cita o exemplo da Ferrovia Transnordestina Logística (FTL), em que a ANTT recomendou a caducidade, mas o Ministério dos Transportes optou por não efetivá-la, permitindo a continuidade da concessão. Nos casos da FCA e RMS, afirma que processos administrativos foram abertos para correção de descumprimentos contratuais, mas que não houve sanções efetivas.
No processo, o tribunal reconhece que, em concessões ferroviárias já repactuadas, houve seu próprio aval, mas justifica que “o TCU não delibera sobre a prorrogação em si, mas sim sobre a observância dos requisitos legais e técnicos que fundamentam tal decisão”.
Na prática, o poder de decisão sobre prorrogações contratuais é do Ministério dos Transportes e da ANTT. O TCU não pode impedir a renovação, mas pode impor condicionantes e fiscalizar a vantajosidade da decisão.
De maneira geral, o tribunal sinalizou que algumas renovações passadas foram aprovadas com base em premissas que estão sendo reavaliadas. Houve um endurecimento da fiscalização, porque o histórico de descumprimentos e abandono de trechos ficou mais evidente. “Embora o tribunal tenha avalizado renovações passadas, a repetição desse modelo sem uma análise aprofundada das consequências pode resultar na perpetuação de falhas estruturais”, afirma a corte.
No caso da Rumo Malha Paulista, a renovação foi aprovada, mas condicionada a investimentos e compromissos claros de expansão e melhorias. Já a nova concessão da Estrada de Ferro Carajás (Vale) incluiu cláusulas para ampliação da capacidade e atendimento de demandas sociais.
Por meio de nota, o Ministério dos Transportes afirmou que vai apresentar o plano de ação já estruturado em relação aos contratos citados.
“Importante ressaltar que o MT criou a primeira Secretaria Nacional de Ferrovias para coordenar as soluções logísticas e operacionais dessas concessões. Nesse sentido, foram estabelecidos cinco Grupos de Trabalho para estudar as renovações antecipadas, a Transnordestina, a Malha Oeste e Malha Sul, no intuito de promover a ampla discussão e transparência do processo de decisão”, afirmou a pasta.
O grupo foi o responsável pela publicação de uma portaria do ano passado, que estabelece as diretrizes para renovação antecipada dos contratos que estão em prazo final de vigência, e uma instrução normativa que regulamenta a metodologia de indenização de trechos a serem devolvidos pelas concessionárias, contando com o apoio do TCU ao longo do processo de construção destes normativos, afirmou o MT.
Em parceria com a ANTT, o ministério estabeleceu os procedimentos para chamamento público de trechos ociosos ou antieconômicos, tornando possível ofertar ao mercado a exploração de malha ferroviária ociosa com toda segurança jurídica.
“A pasta também contratou os estudos para estruturação de novas licitações das malhas que estão com contratos em fim de vigência, incluindo trechos operacionais e não operacionais. O Ministério dos Transportes reforça o compromisso em promover as soluções logísticas e operacionais no âmbito desses contratos de forma transparente e planejada”, concluiu.