Pedro Lima tinha 20 anos quando tomou a decisão que deixaria sua mãe furiosa e mudaria para sempre a história da família.
Estudante de agronomia desde os 17 na então Escola Superior de Agricultura de Mossoró, atual Universidade Federal Rural do Semiárido, ele decidiu largar os estudos e voltar à terra natal para tocar os negócios do pai.
A terra natal, no caso, era a minúscula São Miguel, município de 22 mil habitantes no sertão do Rio Grande de Norte, a 430 km de Natal. E os negócios do pai eram quatro, de ramos diferentes –uma padaria, uma empresa de café, uma fábrica de sabão e uma escopadeira de arroz–, nenhum dos quais dava dinheiro, nas palavras do próprio Pedro.
A fúria da mãe era compreensível. Costureira, dona Joana teve oito filhos e viu três morrerem antes mesmo de completar 5 anos –nos anos 1950, em que a mortalidade infantil era uma epidemia no sertão nordestino. Via, portanto, na educação uma oportunidade para que seus filhos tivessem uma condição de vida melhor.
Acontece que, mesmo contrariada, ela é uma visionária. Quando percebeu que Pedro estava conseguindo rentabilizar o negócio de café da família, resolveu telefonar para os dois filhos mais novos, Paulo, 18, e Vicente, 16, que também estavam estudando em outra cidade. Disse que voltassem e que ela ia criar uma empresa no nome dos três irmãos.
Assim, em um acerto costurado pelas mãos de dona Joana, nascia a JAL, precursora do grupo 3corações, hoje a maior empresa de café do Brasil, com faturamento anual de mais de R$ 10 bilhões.
Poucos anos depois, tiveram que mudar de nome. JAL –em homenagem ao pai, João Alves de Lima– não era uma marca vendável, segundo publicitários consultados na época por Pedro e seus irmãos. Rebatizaram a empresa como Santa Clara.
Com o tempo, a Santa Clara cresceu e atravessou a divisa com o Ceará. O primeiro grande divulgador da marca foi o cantor Raimundo Fagner, amigo de infância da família.
Então no auge da carreira, com sucessos como “Deslizes” e “Borbulhas de Amor”, Fagner aceitou gravar um comercial para os amigos. E assim o café Santa Clara foi lançado em Fortaleza com grande sucesso.
O resto é história conhecida. A Santa Clara aportou em Minas Gerais, onde está concentrado o maior cultivo de café do mundo. Continuou expandindo e comprando outras marcas até que, em 2005, por meio de uma joint venture com a israelense Strauss, incorporou a tradicional marca mineira 3 Corações. A operação deu mais força à empresa para adquirir outras concorrentes e se tornar líder do setor no Brasil. Hoje, vende não apenas o café moído, mas também solúvel, cápsulas e bebidas prontas para beber, entre outros.
Aos 60 anos, Pedro é CEO do grupo e segue atento aos rumos do mercado. Certo dia, ao visitar a filha, que morava nos Estados Unidos, surpreendeu-se com uma bonita garrafa na geladeira. Perguntou o que era, e a filha respondeu que se tratava de leite vegetal. “Pai, ninguém toma mais leite de vaca”, disse-lhe a filha na ocasião.
Pedro mal pousou no Brasil e já tratou de se reunir com donos de uma fabricante nacional de leite de castanha. Com isso, por meio de mais uma joint venture, incorporou ao portfólio do grupo uma marca de leite vegetal (A Tal da Castanha) e de produtos funcionais (Ultracoffee).
Pedro, que teve o futuro alinhavado por dona Joana, parece ter aprendido o ofício da mãe. Costurando acordos, segue cosendo o futuro da empresa.
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