Entregadores de aplicativo anunciaram, por meio das redes sociais, uma greve nacional que acontecerá nos dias 31 de março e 1º de abril para reivindicar melhores condições de trabalho e reajuste de remuneração.
Entre as principais demandas da mobilização estão: o estabelecimento de uma taxa mínima de R$ 10 por entrega, o aumento do valor pago por quilômetro rodado de R$ 1,50 para R$ 2,50, a limitação do raio de atuação das bicicletas para até três quilômetros e o pagamento integral por pedidos agrupados.
Os organizadores da greve também denunciam práticas antissindicais, como incentivos financeiros para desencorajar a participação dos entregadores na mobilização. Gil Almeida dos Santos, presidente do SindimotoSP, afirma que a greve ocorrerá em todo o Brasil, que conta com cerca de 1,8 milhão de entregadores e mototaxistas. Só em São Paulo, segundo Santos, a categoria tem entre 700 e 800 mil trabalhadores.
“Um dos principais desafios é o reconhecimento das empresas desses trabalhadores como parte do quadro efetivo de funcionários e não como colaboradores. Embora não seja uma vinculação tradicional, existe uma relação de subordinação e controle por meio dos algoritmos”, afirma o presidente do SindimotoSP sobre os desafios associados à regulamentação da profissão.
No perfil “Breque Nacional do Apps”, trabalhadores da categoria têm se mobilizado ativamente sobre a paralisação e as demandas do movimento.
A Folha teve acesso a um posicionamento enviado pelo Ifood para os entregadores do Breque Nacional. Nela, a empresa diz que está atenta ao cenário econômico e que estuda a viabilidade de um reajuste para 2025. O Ifood também argumenta que, nos últimos três anos, houve o aumento do valor mínimo da rota de R$ 5,31 para R$ 6,50.
“Quanto às rotas de bicicletas, reduzimos o raio de entrega em janeiro e padronizamos isso em todas as cidades do Brasil. Reduções adicionais poderiam resultar em uma queda na oferta para bicicletas e, consequentemente, impacto negativo nos ganhos”, afirma a empresa.
A Amobitec (Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia), entidade que representa oficialmente plataformas de entrega, como Uber, 99 Taxi e Ifood, diz que respeita o direito de manifestação e informa que suas empresas associadas mantêm canais de diálogo contínuo com os entregadores.
Com relação à remuneração dos entregadores, a associação aponta que, de acordo com o último levantamento do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento), a renda média de um entregador do setor cresceu 5% acima da inflação entre 2023 e 2024, chegando a R$ 31,33 por hora trabalhada.
“As empresas associadas da Amobitec apoiam a regulação do trabalho intermediado por plataformas digitais, visando a garantia de proteção social dos trabalhadores e segurança jurídica das atividades”, diz a entidade.
Em nota, o Rappi diz que reconhece o direito à livre manifestação pacífica e que está buscando soluções que possam favorecer os profissionais.
“Quanto à remuneração, e atenta aos custos relacionados aos aumentos dos combustíveis, a empresa realizou ajustes nas tarifas recebidas pelos entregadores independentes recentemente”, afirma a empresa.
Segundo o Rappi também é concedido aos entregadores centros de atendimento presenciais, suporte em tempo real, capacitação online, informativos com dicas de segurança no trânsito, botão de emergência para situações de risco de saúde ou segurança, seguro para acidente pessoal, invalidez permanente e morte acidental.
“O Rappi considera que a sustentabilidade de seu ecossistema digital somente é possível quando os três elos de sua cadeia estão amparados, dentre os quais estão os entregadores independentes cadastrados na plataforma”, diz a empresa.
O advogado Hugo Fonseca, do escritório Mauro Menezes & Advogados, afirma que a mobilização é uma resposta coletiva à ausência de direitos.
“Enquanto as empresas de aplicativos vendem a ideia individualista de um suposto empreendedorismo, este movimento mostra que os trabalhadores têm consciência de que, na verdade, são parte de uma relação de trabalho desigual que precisa ser regulada. Trata-se de um momento de ampla relevância para o sindicalismo brasileiro e para os direitos sociais e que, por isso, merece o apoio de toda a sociedade”, diz o advogado.
REGULAMENTAÇÃO
A regulamentação de motoristas de aplicativo deve ser julgada ainda este ano pelo MTE (Ministério do Trabalho e Emprego) por meio do projeto de lei complementar 12.
O relatório está pronto desde julho e o texto mantém a categoria de motorista de aplicativo de transporte de passageiros como nova profissão, autônoma e sem vínculo pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), como o MTE havia proposto após dez meses de reuniões entre governo, empresas e trabalhadores em 2023.
O projeto foi enviado ao Congresso em fevereiro de 2024 e prevê alíquota de contribuição ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) em 7,5% sobre parte dos rendimentos, remuneração mínima com base no salário mínimo e direito à sindicalização. As empresas também pagarão contribuição à Previdência.
O tema está em debate no STF, que aguarda para julgar ação sobre o trabalho em aplicativos.