O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai usar ferramentas de inteligência para combater fraudes e detectar riscos em benefícios sociais, como o Bolsa Família.
A medida é uma das que compõem o novo plano de ação da Rede Federal de Fiscalização do Bolsa Família e do Cadastro Único, lançado nesta terça-feira (18).
O conjunto de medidas também prevê a criação de um grupo técnico para discutir o aperfeiçoamento da gestão do BPC (Benefício de Prestação Continuada), pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda (até um quarto de salário mínimo por pessoa, o equivalente a R$ 379,50).
O crescimento acelerado das despesas com o BPC é um dos principais desafios da equipe econômica para fechar as contas do Orçamento de 2025. Diante disso, a intenção é que o grupo estude e ofereça soluções para ampliar a fiscalização e melhorar o desenho da gestão do programa, que hoje depende fortemente da articulação entre União, estados e municípios.
“Buscamos a eficiência. O trabalho prioritário é ir atrás de quem ainda não encontramos [e não está no Cadastro Único], mas também queremos ser bastante rigorosos com o dinheiro público. Cada centavo tem de ser tratado com eficiência, o dinheiro tem que chegar a quem tem direito”, disse o ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Wellington Dias, em discurso no lançamento das medidas.
“[A diretriz é] não criminalizarmos pobres, mas não abrir mão de criminalizar quem usa os pobres para fraudes”, acrescentou.
Embora o BPC seja uma política do MDS (Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social), operacionalizada em conjunto com o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), o grupo técnico será coordenado pela ministra da Gestão e Inovação, Esther Dweck. A avaliação é de que o trabalho deve ficar sob o comando de quem já cuida de iniciativas ligadas à estrutura e reforma do Estado.
A Rede Federal de Fiscalização do Bolsa Família e do CadÚnico foi criada em junho de 2023, a partir da lei que promoveu a reformulação do programa de transferência de renda. Sob coordenação do MDS, ela conta com a participação de outros órgãos do Executivo, como CGU (Controladoria-Geral da União), AGU (Advocacia-Geral da União), Ministério da Gestão e Secretaria-Geral da Presidência.
O novo plano de ação também vai contar com a colaboração da Polícia Federal, para a formação de um grupo que fará o acompanhamento de denúncias envolvendo fraudes nos benefícios, bem como o mapeamento antecipado de riscos, a partir do uso de ferramentas de inteligência.
“Cada centavo destinado ao Cadastro Único é investimento em cidadania. Cada recurso desviado do Cadastro Único é um crime contra a vida”, afirmou o ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Marcio Macedo.
Como mostrou a Folha, o governo já tem no radar alguns municípios onde houve forte aumento de famílias unipessoais (com um único integrante) nos meses que antecederam os períodos eleitorais de 2022 e 2024. Alguns deles inclusive pararam de se comunicar com o gestor central dos programas sociais (neste caso, o MDS). Eles são classificados como “municípios críticos”.
Em alguns casos, houve troca de comando no poder local, e o contato foi restabelecido, o que tende a facilitar a criação de uma força-tarefa para tentar regularizar os cadastros. Nas demais situações problemáticas, a rede de fiscalização deve atuar para estabelecer uma trilha de investigação com a PF.
A estratégia do governo também inclui um projeto de combate a notícias falsas (fake news) envolvendo o Bolsa Família.
Outra proposta inserida no plano é o envio de missões institucionais da rede de fiscalização para verificar a situação dos Cras (Centros de Referência e Assistência Social), que são a porta de entrada para o Cadastro Único e, consequentemente, uma série de benefícios sociais financiados por União, estados e municípios.
Os representantes da rede já fizeram algumas visitas em São Paulo e agora pretendem planejar missões no Distrito Federal, onde, em 2022, uma mulher morreu após passar mal enquanto aguardava atendimento no Cras.
O lançamento do novo plano de ação deve, na visão dos formuladores, consolidar o Bolsa Família e o CadÚnico como políticas de todo o governo, não só do MDS.
As medidas de regularização dos cadastros de benefícios sociais são prioritárias inclusive para a equipe econômica, que conta com a detecção de fraudes para frear o crescimento dessas despesas e evitar a necessidade de bloqueios em outros gastos para cumprir as regras fiscais.
No Orçamento de 2025, por exemplo, o governo já propôs um corte de R$ 7,7 bilhões na dotação orçamentária do Bolsa Família.
A decisão teve como base as medidas de aperto aprovadas no fim do ano passado e que ainda precisam ser regulamentadas. Elas incluem a possibilidade de endurecer a regra de proteção para beneficiários que arranjam emprego com carteira assinada (a regra atual garante o pagamento de 50% do benefício por até 24 meses), a continuidade da averiguação das famílias unipessoais e aperfeiçoamentos da gestão do programa.
Como mostrou a Folha, o número de beneficiários do Bolsa Família supera a estimativa de famílias em situação de pobreza em 1.211 municípios brasileiros, ou 21,7% do total. O mapa serve de termômetro para o governo direcionar os trabalhos de averiguação cadastral.