Nos últimos 12 meses, a inflação da alimentação no domicílio foi de 7,2%, bem acima da inflação ao consumidor, de 5% no mesmo período. Sendo item de consumo básico, é perceptível por toda a população e reduz o poder de compra das famílias, especialmente as mais pobres.
Esse é o pano de fundo que fez o governo retomar a discussão sobre os preços dos alimentos, anunciando um conjunto de medidas para conter sua inflação. Entre elas está a redução da alíquota de importação sobre alguns produtos. Também está em discussão uma possível negociação para que os estados zerem a cobrança de ICMS sobre os itens da cesta básica.
Ainda que uma redução de impostos possa trazer algum alívio para a inflação a curto prazo, ele é um instrumento pouco eficaz para conter a alta de preço da comida. Afinal, o preço dos alimentos flutua por inúmeras outras razões que estão fora do controle do governo, como condições climáticas, câmbio e preços de produtos que são negociados no mercado internacional (commodities).
Além disso, as implicações das desonerações de imposto não se limitam aos seus impactos sobre preços, já que uma renúncia de impostos também reduz a arrecadação, deteriorando o resultado fiscal e a trajetória da dívida.
E mesmo que a desoneração estivesse sendo pensada como instrumento de política pública, que tem sua implementação voltada para a população pobre e para a redução das desigualdades, esse seria um direcionamento de alto custo e baixo retorno. Por mais que os alimentos ocupem parte substancial do orçamento das famílias de baixa renda, uma desoneração ampla beneficia inclusive os mais ricos, que também consomem alimentos. Nesse sentido, programas de transferência de renda, a exemplo do Bolsa Família, funcionam melhor para endereçar a vulnerabilidade alimentar dos pobres.
Apesar de existirem poucos argumentos favoráveis ao uso das desonerações para controlar a inflação, ou então para aliviar a perda do poder de compra das famílias de baixa renda, seu uso vem se dando de forma recorrente no passado recente. Vale lembrar que, em 2022, a preocupação girava em torno da inflação de combustíveis, puxada pelo preço do petróleo, que escalou com o início da guerra entre a Rússia e a Ucrânia.
Naquele ano, o governo zerou tributos federais sobre gasolina, etanol e diesel e aprovou um teto para o ICMS cobrado pelos estados. As renúncias, em termos de impostos, foram enormes. Apenas no caso do ICMS, a União precisou repassar R$ 27 bilhões aos estados para compensar as perdas com a redução da alíquota. No caso dos impostos federais, as estimativas da renúncia fiscal chegaram a R$ 50 bilhões ao ano. A reoneração, que se iniciou de forma parcial em 2023, mas que foi concluída apenas em 2024, deixa evidente que o custo político de desfazer tais medidas é alto.
Talvez mais importante agora seja o fato de a nova reforma tributária colocar limites para os tributos serem utilizados como instrumento de política pública. Introduzir desonerações de forma seletiva vai na contramão de uma reforma que visa promover simplicidade e previsibilidade. E, sob o regime dual, é importante garantir que os estados mantenham a prerrogativa de definir suas próprias alíquotas.
Utilizar medidas tributárias para o controle da inflação, além de ser pouco eficaz, prejudica a transição para um regime tributário melhor e mais justo.
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