A reforma do Imposto de Renda do governo federal propõe um cálculo especial para beneficiar apenas salários de até R$ 7.000, que terão um desconto especial, à parte, para reduzir o imposto cobrado. Para evitar um salto na cobrança entre as faixas de renda, o desconto vai sendo reduzido aos poucos para quem ganha entre R$ 5.000 e R$ 7.000. O governo propõe isentar quem ganha até R$ 5.000.
A principal dúvida dos contribuintes, que foi reforçada por especialistas em redes sociais, é se alguém com um salário de R$ 6.999, por exemplo, que teria esse desconto extra, teria um salário líquido maior do que quem ganha mais —R$ 7.001—, que teria de pagar o tributo conforme a tabela do IR já existente.
Segundo estudo do economista Sérgio Gobetti publicado no Observatório de Política Fiscal do FGV Ibre, quem tem um salário de R$ 6.900 terá um desconto adicional de R$ 11; já uma renda de R$ 7.000 não terá nenhum abatimento extra.
A tabela do pesquisador mostra os cálculos para quem tem renda entre R$ 2.500 e R$ 7.500, e detalha como será a progressividade das alíquotas a serem aplicadas pela Receita.
Veja como ficam os salários com a reforma do IR
Os valores da tabela consideram que o contribuinte declara pelo modelo completo, que abate deduções legais, e tem o desconto do INSS e um dependente.
O estudo também considera um reajuste na faixa de isenção da tabela do Imposto de Renda atual, para acompanhar o aumento do salário mínimo, medida que ainda não foi aplicada pelo governo. Por isso, há uma pequena redução no Imposto de Renda pago para quem tem renda acima de R$ 7.000, mesmo não tendo direito ao desconto especial (na faixa de 1,6% a 2%, nos exemplos da tabela).
Segundo Gobetti, se o governo tivesse optado por reajustar a faixa de isenção da tabela do IR para R$ 5.000, todos os contribuintes que ganham acima desse limite também seriam beneficiados. “Isso porque uma taxa de 0% seria aplicada para os primeiros R$ 5.000 de renda tributável recebidos por todas as pessoas físicas. E o custo disso seria altíssimo, superior a R$ 120 bilhões anuais, segundo nossas estimativas. Logo, em vez de fazer isso, o governo decidiu conceder um desconto extra, por fora da tabela de IR. Esse desconto será de 100% para quem ganha até R$ 5.000 e, a partir daí, será gradualmente reduzido até chegar em 0% nos R$ 7.000”, afirma, em seu estudo.
O especialista diz que há uma diferença quando se usa a renda anual e a renda mensal. Nos seus cálculos, estão previstos os descontos anuais divididos pelo número de meses. Já no cálculo dos técnicos do governo, foi aplicado o desconto simplificado de 20%.
No entanto, para quem optar pela dedução completa no ano, que inclui gastos com saúde, educação e previdência privada, por exemplo, deduzindo mais do que 20%, o desconto especial pode eventualmente superar o valor de imposto devido segundo a tabela do IR.
“Nesse caso, o desconto especial fica limitado ao valor do imposto devido; ou seja, uma isenção completa, mesmo que o declarante tenha uma renda um pouco superior aos R$ 5.000 mensais”, explica.
Isso pode ocorrer porque, enquanto o imposto devido depende da base de cálculo, o cálculo de quanto será descontado tem como base a renda tributável. “E a relação entre base de cálculo e renda tributável varia conforme o nível de dedução que se apresente no ajuste anual.”
A reforma do IR proposta pelo governo também prevê a criação do imposto mínimo para quem ganha mais de R$ 600 mil por ano e, para começar a valer, terá que ser aprovada pelo Congresso.
Para Gobetti, a reforma não trará prejuízo aos cofres públicos, conforme dizem alguns especialistas, caso o Congresso não modifique o imposto mínimo de 10% sobre lucros e dividendos para rendas acima de R$ 600 mil, mas que foca mesmo quem ganha mais de R$ 1 milhão.
O economista afirma que o Brasil demorou a fazer uma reforma que pudesse se assemelhar ao que já é praticado no restante do mundo, mas ainda acha que as mudanças são tímidas e deveriam ser maiores.
“Eu acho que o imposto mínimo é um paliativo interessante; é um bom aperitivo, mas ele não dispensa um prato principal, não dispensa uma reforma maior da renda. O ideal é sentar na mesa, fazer o levantamento de quais são todos os grandes gargalos e traçar um plano”, afirma em entrevista à Folha.
Ele chama de “escandaloso” o fato de não termos feito a reforma do IR até agora, ante vários países da América Latina como Chile, Uruguai e Argentina, e outros da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).
No estudo, que pode ser acessado neste link, o economista afirma que “em vez de se abrir para as tendências internacionais e se modernizar, o Brasil passou a ser dominado pelo mais absoluto conservadorismo”.
“As estimativas realizadas para confecção dessa nota técnica convergem, em grandes números, com aquelas que foram apresentadas pelo governo e indicam que não há risco relevante de que a reforma tenha impacto deficitário sobre as contas públicas, a menos evidentemente que o Congresso decidisse aprovar apenas uma parte das medidas”, conclui.
Quem terá direito à isenção do Imposto de Renda em 2026?
- Terá direito à isenção total do IR quem recebe até R$ 5.000 por mês. Isso ocorrerá a partir de janeiro de 2026, caso o Congresso aprove o projeto do governo do jeito que será enviado.
- Para isso, a faixa inicial da tabela do Imposto de Renda terá reajuste até um valor limite, mais um desconto-padrão de R$ 312,89, para chegar aos R$ 5.000
- Cálculos apresentados pelo Ministério da Fazenda mostram que a economia será de R$ 4.356,89 no ano para trabalhadores em essa renda
- Quem ganha valores entre R$ 5.000 e R$ 7.000 também será beneficiado com uma cobrança progressiva
- Para salários de R$ 5.500, a economia anual é de R$ 3.367,68
- Quem recebe R$ 6.000 terá economia anual de R$ 2.350,79
- Quem ganha R$ 6.500 terá economia de R$ 1.333,90 por ano
- Cerca de 10 milhões de brasileiros serão impactados por essa medida. No total, 65% dos que declaram do Imposto de Renda de Pessoa Física (26 milhões de pessoas) serão isentos
Como ficará o desconto do Imposto de Renda para quem ganha mais de R$ 7.000?
- Quem recebe acima de R$ 7.000 continuará pagando IR com base nas alíquotas progressivas da tabela do imposto, de 7,5%, 15%, 22,5% e 27,5%. Segundo a Fazenda, permanece conforme é hoje em dia, sem aumento
- Mas esses contribuintes pagarão um pouco menos de imposto, pois a tabela atual do IR terá reajuste ainda em 2025, com a ampliação da faixa de isenção
Como o governo vai compensar a perda de arrecadação?
A proposta do governo é aplicar um imposto mínimo de até 10% para aqueles que recebem mais de R$ 50 mil por mês ou R$ 600 mil por ano.
O cálculo de salários, honorários, aluguéis ou outras rendas já tributadas na fonte não mudará para definir esse imposto mínimo. Essa mudança vai impactar 141,4 mil pessoas no país. O Brasil tem mais de 200 milhões de habitantes.
Como será cobrado o imposto de quem ganha mais de R$ 600 mil por ano?
Segundo a Fazenda, será somada toda a renda recebida no ano, incluindo salário, aluguéis, dividendos e outros rendimentos para fazer a cobrança. Não entram nesta lista valores recebidos de herança e venda de bens.
Se, no ano, a soma for menor que R$ 600 mil, não há cobrança adicional do IR. Se ultrapassar esse valor, aplica-se uma alíquota que cresce gradualmente até 10%, atingindo quem ganha R$ 1,2 milhão ou mais.
O cálculo final será feito pelo programa do Imposto de Renda, na apresentação da declaração. Com isso, o impacto será sentido apenas na prestação de contas do IR de 2027, que terá como base o ano de 2026.
Na conta para saber o valor do imposto devido, alguns rendimentos são excluídos, como ganhos com poupança, títulos, indenizações, aposentadorias e pensão por doenças graves, e outros rendimentos mobiliários isentos.