Uma receita de bolo é uma fórmula química que deveria dar o mesmo resultado sempre, mas não dá. São muitas variáveis, e é preciso acertar em todas: peso dos ingredientes, ordem do preparo, tempo e temperatura do forno. Como resolver essa equação é o mote do terceiro capítulo da série de reportagens Bê-á-bá da Confeitaria, que reúne dicas para elaborar doces em casa.
“Fazer bolo é uma ciência exata, mas tem um certo mistério”, diz Joyce Galvão, chef confeiteira e dona do portal Sobremesah. “Se você mudar a ordem ou a temperatura dos ingredientes, vai dar um resultado diferente.”
A primeira regra é seguir exatamente a receita —e não qualquer receita. “Precisa ser bem escrita”, afirma a chef confeiteira Carole Crema, autora do livro “O Mundo dos Bolos da Carole Crema” (ed. Senac Rio, 160 págs., R$ 119).
Isso quer dizer que o texto tem que trazer detalhes sobre o modo de preparo, deixando claro, por exemplo, como cada item deve ser incorporado à massa.
Na hora de separar as quantidades, o ideal é pesar tudo com uma balança, em vez de usar medidas caseiras, descritas em xícaras ou colheres. Isso porque os recipientes são diferentes entre si, inclusive os copos de medida.
“Já comparei dez jogos de xícaras medidoras e elas não tinham o mesmo volume”, afirma Otávia Sommavilla, escritora de livros de confeitaria e produtora de conteúdo para internet.
Uma forma de contornar esse problema é usar o mesmo recipiente para todos os ingredientes. Ainda assim, pode dar variação. “Se você mergulhar a xícara no pote e ela sair alta de farinha, é diferente de você nivelar o copo [tirar o excesso com uma espátula], que é a forma correta de fazer”, diz Sommavilla, autora de “Enciclopédia dos Bolos”, em três volumes (ed. Melhoramentos).
Com tudo porcionado, é hora de começar o preparo. Há três métodos de fazer bolo: espumoso, cremoso e direto. O método espumoso é aquele em que os ovos são batidos com açúcar. Depois, os ingredientes secos são incorporados à mistura. O resultado é uma massa aerada, como pão de ló, genoise e bolo chiffon.
“Os ovos precisam estar frescos e devem ser usados em temperatura ambiente. Isso faz diferença no volume final do bolo”, diz Helen Fernanda Ataíde, docente da pós-graduação em confeitaria e panificação do Centro Universitário Senac – Santo Amaro.
Já no método cremoso, o que vai na batedeira é a manteiga e o açúcar —processo chamado de cremagem. Depois, são acrescentados os ovos, também em temperatura ambiente, e, por fim, os secos. A técnica resulta em uma massa amanteigada e úmida, que endurece se for levada à geladeira. São exemplos o pound cake ou quatre quarts, red velvet, bolo mármore e formigueiro.
Por último, existem as massas de método direto, em que tudo (ou quase tudo) é batido junto. Nessa categoria, entram os muffins americanos e os bolos de liquidificador, com ingredientes sólidos, como cenoura ou banana.
Em todos os casos é preciso peneirar a farinha junto com o fermento, e a mistura deve ser incorporada à massa de forma devagar, de preferência à mão. “A batedeira é importante no início, para fazer a espuma dos ovos ou a cremagem. Depois, ela não é legal, porque, se batermos muito a farinha, vai desenvolver o glúten, o que pode deixar o bolo borrachudo”, afirma Carole Crema.
Também é imprescindível pré-aquecer o forno por 15 a 20 minutos a 180 ºC e jamais se deve abrir a porta do eletrodoméstico antes que o bolo esteja firme e levemente dourado —vale fincar um palitinho para ver se ele sai limpo, mas só no fim do processo.
Depois de assado, deixe esfriar para só então cortar e rechear. Massas do método espumoso combinam mais com recheios leves, como musse, chantili e butter cream. Massas do método cremoso vão bem com preparações mais densas, como ganaches e brigadeiros.
“Eu sempre penso: quem eu quero que brilhe? Se quero que a massa brilhe, faço um bolo com sabor muito bom e um recheio mais neutro, como uma receita minha com massa de cumaru, recheio de iogurte e cobertura de açúcar mascavo. Já se quero que o recheio brilhe, faço uma massa mais neutra, de baunilha ou de nada”, diz Joyce Galvão.
Antes de rechear, é possível molhar a massa com calda de água e açúcar, mas cuidado para não exagerar. “Se umedecer demais, o bolo desmonta”, diz Helen Ataíde. Ela recomenda que a preparação seja feita em dois dias: no primeiro, faça a massa e recheie; no segundo, aplique a cobertura.
Em geral, essas receitas têm validade de três dias na geladeira. Se tiver frutas frescas, pode durar menos, principalmente se elas tiverem sido cortadas. “É melhor usar frutas inteiras ou cozidas”, completa Carole Crema.